Autor: Dra. Fernanda Seligmann Feitosa
O tabagismo é o principal fator de risco cardiovascular prevenível e deverá causar cerca de 1 bilhão de mortes no mundo durante o século 21. Devido a sua importância, é um dos temas de destaque do ESC 2012, realizado em Munique, na Alemanha. Numa sessão sobre tabagismo e doença cardiovascular apresentada hoje, quatro trabalhos importantes foram apresentados.
O primeiro deles, apresentado pelo Dr. Johannes Schmucker, da Alemanha, avaliou a incidência de infarto agudo do miocárdio após a implementação da lei que proíbe o tabagismo em locais públicos, em 2008, na cidade de Bremen, na Alemanha. Neste estudo foi observada uma redução de 16% na incidência de infarto agudo do miocárdio (IAM) com supradesnivelamento do segmento ST na população global após a lei anti-tabagismo (65 por mês antes até 2008, contra 55 por mês após 2008). O curioso é que esta incidência foi diminuída apenas entre os não tabagistas, ou tabagistas passivos (redução de 26%, de 38 para 29 IAM por mês), porém permaneceu estável entre os tabagistas ativos (aumento não significativo de 4%), como mostra a figura abaixo.
O Dr. Schmucker ressaltou que os tabagistas ativos inalam uma dose tão alta de tabaco que o fato de estarem menos expostos ao tabagismo passivo em locais públicos não altera o seu risco em particular, mas que a medida teve um impacto positivo na população como um todo. Este declínio foi ainda mais significativo em jovens não fumantes, com redução de 31% da incidência de IAM após a lei. Isto sugere que a expansão das leis anti-tabagismo poderia reduzir ainda mais a incidência de IAM no futuro.
No segundo estudo, apresentado pelo Dr. Mehmet G. Kaya, foi avaliado o efeito do tabagismo passivo sobre a reatividade plaquetária em indivíduos saudáveis. Foram avaliados 3 parâmetros: volume plaquetário médio, níveis de carboxi-hemoglobina e de lactato, bem como a correlação destes três parâmetros. Para o estudo, 55 voluntários saudáveis com idade média de 26 anos foram submetidos a 1h de tabagismo passivo. Os níveis dos três parâmetros aumentaram significativamente após a exposição, com boa correlação entre eles, demonstrando que mesmo o tabagismo passivo aumenta significativamente a reatividade plaquetária. Estes resultados poderiam explicar o possível mecanismo para o aumento do risco de eventos trombóticos observado em pessoas submetidas ao tabagismo passivo.
Outro estudo abordou o tema tabagismo em adolescentes e foi apresentado pela Dra. Julia Dratva, da Suíça,. Neste estudo, 288 adolescentes foram submetidos a exame clínico, seguido por avaliação antropométrica, aferição da pressão arterial sistêmica, avaliação da espessura médio-intimal carotídea e exames laboratoriais com dosagem de biomarcadores. Eles relataram sua atividade física, exposição a tabagismo passivo e tabagismo ativo. Onze por cento dos participantes relataram ser tabagistas (fumo diário ou semanal), com tempo de tabagismo médio de 2,3 ± 1,98 anos. A exposição ao tabagismo passivo esteve presente em 31% das crianças até 10 anos, 3% eram obesos, 13% tinham sobrepeso e 60% relataram menos de 4 horas de atividade física semanal. A presença de tabagismo ativo foi significativamente associada a aumento da espessura médio-intimal carotídea (aumento de 0,043mm; IC 95% 0,014 – 0,073). Este espessamento pode representar aterosclerose precoce e já foi correlacionado a aumento do risco cardiovascular, o que pode se traduzir em futuro aumento da incidência de eventos cardiovasculares. Mais estudos ainda são necessários para avaliar se este espessamento é reversível e se existe uma correlação dose-resposta, mas ficou claro que o tabagismo precoce, mesmo que apenas semanalmente, pode promover inflamação do sistema cardiovascular, com espessamento médio-intimal carotídeo.
Na última apresentação, o Dr. Konstantinos Farsalinos, da Grécia, avaliou os efeitos dos cigarros eletrônicos, dispositivos atualmente utilizados na tentativa de interromper o tabagismo. Estes dispositivos simulam o efeito do cigarro ao produzir um vapor inalável menos tóxico que os cigarros normais, com quantidade mínima de nitrosaminas. O estudo comparou 20 tabagistas sem doença conhecida entre 25 e 45 anos com 22 usuários de cigarros eletrônicos da mesma idade depois do uso do cigarro de tabaco e do eletrônico, respectivamente. Foi observado que os tabagistas tiveram exposição ao tabaco 44% maior e apresentaram disfunção miocárdica aguda, quando comparados aos usuários de cigarros eletrônicos. Foi observado também aumento na frequência cardíaca e nos níveis pressóricos sistólicos e diastólicos, enquanto os usuários de cigarros eletrônicos apresentaram apenas uma leve alteração da pressão arterial diastólica. O Dr. Farsalinos argumentou que ainda é cedo para dizer que os cigarros eletrônicos são uma revolução no dano provocado pelo tabagismo, mas são um grande avanço, já que atacam tanto o vício químico quanto o psicológico, além de serem menos tóxicos que o cigarro de tabaco. Porém, deve ser utilizado apenas para os tabagistas pesados e não como uma alternativa menos tóxica de cigarros às pessoas que não fumam.
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